A noite foi maravilhosa, tudo correu como desejado, mas ao mesmo tempo foi surpreendente, pois o desejo era mais um sonho que uma expectativa. O beijo foi bom e correspondido, a tensão estava no ar, os corpos arrepiados, as sensações hiperbolizadas, tudo foi perfeito, então porque depois o cara não liga?
Nina estava radiante, há muito não se sentia tão bem consigo mesma, tão segura, tão bonita. Acabara de comprar um vestido maravilhoso, sua semana havia sido ótima, e estava se preparando para sair com as amigas. Não havia pretensões nenhuma para a noite, seu último rolo havia finalmente se desencantado e virado pó, e ela estava se sentindo finalmente com o coração livre para novas emoções, até para nenhuma, pois para aquela noite, sua maior ambição era se divertir e dançar o máximo possível com as amigas. E se voltasse sozinha para casa não iria ficar chateada, pois ela estava se bastando, afinal era uma mulher segura e realizada, não precisava de homem para ser feliz.
E a noite começou como ela antecipara, as amigas foram se aquecer no apartamento de Nina. Enquanto ela terminava de se arrumar, tomaram uma garrafa de champanhe para abrir com glamour a noitada. Nina já havia combinado com seu taxista habitual para levá-las e buscá-las, elas já estavam com o endereço das melhores festas da noite, iriam visitar todas até se decidirem por qual estivesse mais animada. E assim saíram de casa: animadas, calibradas, lindas, cheirosas, independentes e poderosas. Já na primeira festa encontraram logo outras amigas e resolveram ficar. Depois de um tempo do lado de fora rindo e conversando, entraram e conseguiram uma boa mesa, que se tratava na verdade de um sofá oval com uma pequena mesa de centro, onde acomodaram as bolsas, o balde de gelo e os diversos copos. As sete mulheres ficaram em pé, conversando ou dançando, chamando a atenção de todos os homens, solteiros e acompanhados.
Já por volta da meia noite os mais corajosos começaram a se aproximar. Algumas de suas amigas já estavam engatadas animadamente em papos com alguns pretendentes, mas Nina seguia totalmente distraída, prestando atenção somente à música. Alguns homens já haviam tentado se aproximar dela, mas como Nina não parava de dançar, não conseguiam engatar uma conversa mais íntima com ela. Até que finalmente um deles conseguiu chamar sua atenção. Diferentemente de todos os outros que haviam tentado antes, ele se aproximou com uma garrafa de champanhe na mão, fechada, e começou a dançar com ela, sem dizer nenhuma palavra. Depois de alguns minutos, fez sinal para a garrafa, perguntando se podia colocá-la no balde da mesa de Nina. Ela não se opôs, ao que ele abriu a champanhe, ofereceu para todas as amigas de Nina, e por último a ela. Ela aceitou e começou a dançar mais devagar, agora já mais interessada.
Mas ele não quis conversar, seguiu dançando, muito animado, a noite toda, comprou ainda mais duas champanhes que dividiu com Nina e suas amigas, agora reduzidas a apenas mais duas, pois as outras quatro já haviam sido fisgadas mais cedo. Nina já estava intrigadíssima e muito interessada, sua autoconfiança já começando a traí-la, porque o cara interessante não desgrudava dela, só dançava com ela, mas também não avançava nem mais um milímetro. Ou ele era muito bom de conquista, ou era gay, eram suas hipóteses. Nina resolveu pagar para ver e continuou o jogo dele. A boate começou a se esvaziar, suas duas últimas amigas solteiras já estavam sentadas no sofá, cansadas, e Nina também já estava desistindo de esperar qualquer avanço do seu pretenso paquera. Ela pediu licença e chamou as amigas para irem embora. Foi quando finalmente ele resolveu agir. Se aproximou e em seu ouvido pediu para que ela se despedisse das amigas e fosse com ele terminar a noite em um restaurante próximo dali, onde poderiam continuar bebendo, comer alguma coisa e conversar mais confortavelmente, sem ter que gritar. Antes que ela falasse qualquer coisa, prometeu que a deixaria ir quando ela quisesse, apenas queria conhecê-la melhor. Nina, curiosa, aceitou. As amigas, solidárias, se despediram rapidamente com sorrisos maliciosos nos rostos.
Nina seguiu com Pedro, agora devidamente apresentado, para o restaurante próximo à boate. Assim que chegaram, a pé mesmo, Nina pensou em tratar-se de uma manobra estratégica o fato do restaurante ser dentro de um hotel cinco estrelas. Pedro explicou que era o único restaurante decente que eles encontrariam aberto àquela hora. Sem querer dar sinal de covardia, ela entrou orgulhosa no ambiente luxuoso e vazio. Tiveram um pós-noite super agradável, comeram, beberam refrigerante e suco, refizeram-se do álcool, e puderam conversar sobriamente sobre os mais variados assuntos, trocando confidências inofensivas. Pedro se portou como um cavalheiro, e apesar de muito galante, em nenhum momento tentou seduzi-la. A atitude dele mexeu com os brios dela e quando não restava mais nada a não ser pedir a conta, foi ela quem avançou, já não agüentando mais o excesso de comedimento da parte dele. Era o sinal que ele precisava. Em um segundo Pedro já havia se movido da cadeira em frente para a cadeira ao lado de Nina e acariciava intensamente o cabelo e a nuca dela. Ela se virou um pouco para o lado dele, a fim de facilitar o encontro dos rostos, mas o beijo levou cerca de cinco minutos para ocorrer, pois Pedro fez questão de percorrer todo o rosto, pescoço, colo, orelha e cabelo de Nina com seu próprio rosto, como se estivesse tentando captar os cheiros de cada parte do seu corpo, até chegar novamente à boca e começar, com um beijo calmo e tímido sobre os lábios, que foi evoluindo gradativamente em força, intensidade e invasão de línguas.
Sem entender bem como, Pedro já havia pago a conta e eles estavam ainda se beijando, agora em pé de frente para a recepção do hotel, enquanto a recepcionista fazia o check-in de uma suíte para eles. E se beijando foram para o elevador, subiram até o décimo andar, entraram no quarto, se despiram, se jogaram na cama e fizeram amor por mais de trinta minutos. Deram um breve intervalo de cinco minutos silenciosos onde somente se olharam, como se estivessem guardando os detalhes do corpo de cada um, e assim, sem nenhuma palavra, voltaram a se beijar e se amar, por mais uma hora, desta vez, mais calmamente, mas não menos intensamente. Se amaram como se fossem amantes de longa data, que houvessem estado distantes um do outro forçosamente por muito tempo, e que finalmente se encontravam para uma noite apenas. O dia finalmente raiou sem que eles dormissem, e enquanto Pedro pedia o café para ser servido no quarto, Nina foi tomar um banho. Tomaram café, trocaram elogios e telefones, namoraram um pouco mais e resolveram ir embora.
Ele pediu um taxi e a fez questão de ir com ela até seu apartamento antes de seguir para sua própria casa. Nina entrou flutuando em seu apartamento, sem acreditar na noite maravilhosa que acabar de ter. Já fazia planos de engatar em um relacionamento mais sério com Pedro, pois eles haviam tido uma noite perfeita, ele havia se demonstrado super encantado por ela, e parecia mais que apaixonado, parecia fissurado, demonstrou isso de diversas formas, portanto para ela quase certeza. Quando, trinta minutos depois de haver chegado em casa, ele ligou para avisar que havia chegado em sua casa também, que tinha adorado a noite e tê-la conhecido, Nina teve a certeza. Já imaginava agora até casamento e filhos. Foi dormir e acordou sonhando. Pensou várias vezes em ligar, mas não queria ser a primeira. O domingo acabou, a segunda chegou e até quarta-feira Nina agüentou resoluta que Pedro ligasse. A sexta chegou e Nina se recusou a ligar no fim de semana. Somente na quarta da semana seguinte, após várias amigas implorarem para ela ligar, ela tomou coragem e ligou para o celular dele. Caixa postal. Nos dias seguintes, caixa postal novamente. Pediu que uma amiga ligasse, mas o resultado foi o mesmo, caixa postal. Já histérica, Nina começou a deixar mensagens, começou suavemente, perguntando se ele estava bem, até que na décima já estava amaldiçoando a quinta geração da família de Pedro. No fim, desesperada de ódio, desabafou tudo o que precisava na caixa postal que ela já nem tinha mais certeza que era dele e ligou para o ex-rolo para curar o ego.
Tudo porque Nina teve uma noite perfeita e já havia mentalmente planejado todo um relacionamento com um completo estranho. Pedro, por sua vez, apenas queria uma noite, perfeita ou não, porque no dia seguinte tinha que voltar para sua cidade e sua rotina. Meninas, aprendam, a culpa é toda das brincadeiras de criança, que ensinam erroneamente às meninas que elas são princesas, que precisam de príncipes e que depois de encontrarem o tal do príncipe serão felizes para sempre, enquanto os meninos aprendem a ser super-heróis que pegam bandidos, são auto-suficientes e não ligam muito para essa história de felizes para sempre, pois preferem continuar brincando.
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