Amar é bom. Amar é muito gostoso. Não há nada mais emocionante que o início de um relacionamento, a começar pela paquera. Aquele suspense antes da realização da conquista só é menos excitante que o primeiro beijo. Ah, o primeiro beijo, este então é irreprodutível! Como mimetizar aquela sensação eletrizante quando finalmente os corpos se aproximam e é possível sentir pela primeira vez a respiração e o hálito do outro, os lábios se tocam e finalmente o corpo inteiro se arrepia com a sensação de descoberta. E quando os beijos se encaixam, então? O desejo até aumenta, porque beijo bom é sinal que o resto vai ser bom também, é como prenúncio de afinidade química, indicando que o que vai rolar depois também vai ser maravilhoso. Mas isso tudo é só o começo, é a parte da paixão, do efêmero. Depois, quando a paixão vigora e vira relacionamento sério, e esse relacionamento dá certo e vira amor, começam as fases ridículas do amor, e com ela as bobagens que adoramos.
A primeira fase é a da dependência química. Ficamos fissurados e viciados pelo novo amor. Descobrimos que há alguém no mundo por quem faríamos as maiores loucuras, por quem iríamos ao Saara felizes da vida (aos dois Saaras, o centro comercial do Rio e o deserto Africano). Sofremos com a distância e a abstinência, começamos a rezar por momentos a sós, e só queremos aquela pessoa, mais ninguém. Não sentimos mais necessidade de grandes noitadas, de bares com amigos, de família, de trabalho, e passamos a viver como se estivéssemos em uma redoma e não existisse mais nada além de nós dois.
A segunda fase, quando já estamos completamente viciados, é a fase da internação. É quando já estamos completamente afastados dos amigos e começamos a engordar, porque a vida passa a se resumir a passar o dia e a fazer tudo deitado, só queremos nos levantar para ir ao banheiro escovar os dentes e para outras necessidades, das quais tentamos até o último momento fingir que estamos isentos. Mas o resto, comer, ver filmes, conversar, jogar baralho, tem que ser deitado e agarradinho, até tomar banho, mas preferencialmente se houver uma banheira, no chuveiro não dá muito certo, vai por mim, já tentei. Essa fase pode durar tempos variados, depende da capacidade que cada um tem para fugir dos amigos, parentes e responsabilidades.
Um belo dia começamos a ficar literalmente enjoados da posição horizontal e começa a terceira fase, a da regressão cronológica. Vamos conhecendo cada particularidade ridícula da razão do nosso afeto, que, aumentadas pela lente turva do amor idiotizante, cada uma destas particularidades passa a ser o detalhe mais lindo que qualquer ser vivo na face desta Terra poderia apresentar. Aliás, esta fase é toda ridícula, pois é quando começamos falar com vozes de bebês e a inventar apelidos carinhosos um para o outro. Não sei como um adulto em pleno uso de todas as suas capacidades mentais pode achar lindo chamar outro adulto de Pimpão, Ursinho, Florzinha, Rosinha, Tuf-Tuf, Algodãozinho, Dandão, Dandãozinho, Conan, Rainha do Nilo, Margareth Thatcher, e por aí vai. Já usei uns desses, mas não confesso nem sob tortura quais.
É claro que a ordem e a duração de cada fase depende de cada casal. A localização geográfica da parelha também influi. Não dá para ficar muito tempo deitado em Bangú, por exemplo, o calor ou o ressecamento com o ar condicionado vão te tirar do quarto em algum momento. Outros fatores importantíssimos também podem influir, por exemplo, se um dos pombinhos ainda morar com os pais, podem ter certeza que durante a fase da internação serão gentilmente convidados a saírem do quarto após, digamos, uma semana, com ameaça de arrombamento em alguns casos. Mas fato é que este é o processo pelo qual todos os amantes apaixonados e lobotomizados irão passar: encantamento, horizontalização, descoberta, regressão cronológica, constipação, fuga da realidade, engorda, alienação, que pode ou não ser seguido de demissão por abandono de emprego ou ordem de despejo.
Por estas e por diversas outras razões que não teria espaço para relatar aqui é que repito: amor é bom, amar é muito gostoso, mas é ridículo também! E eu desejo a todos que passem por todos esses ridículos, ao menos uma vez nesta existência, porque de sério e chato, basta todo o resto mais da vida.
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